Para Foucault, não é possível dizer qualquer coisa em qualquer tempo. O autor se refere aos discursos circulantes de uma época. São esses discursos que definem aquilo que é ou não passível de enunciação. Aqui, usamos a passagem de Foucault para fazer uma analogia com a contemporaneidade: não é possível falar de influenciadores. De um lado, temos um cenário que facilita a participação dos sujeitos. Um cenário marcado pelo “[...]
choque da inclusão de amadores como produtores, em que não precisamos mais pedir ajuda ou permissão a profissionais para dizer as coisas em público”. De outro lado, estamos em uma sociedade em que a imagem de si é cada vez mais valorizada. O fazer ver é intensificado com a possibilidade de ver e ser visto em espaços e tempos diferentes. Portanto, participar está diretamente relacionado a mostrar-se, implodir a dicotomia entre o público e o privado. O discurso circulante sustenta que os influenciadores são aqueles que têm algum poder no processo de decisão de compra de um sujeito; poder de colocar discussões em circulação; poder de influenciar em decisões em relação ao estilo de vida, gostos e bens culturais daqueles que estão em sua rede. De acordo com dados quantitativos do blog de beleza: Coisas de Diva, 72% de suas leitoras já compraram algo indicado nos posts. Em pesquisa similar, a blogueira Marina Smith, do 2Beauty, descobriu que 83,5% das pessoas que acessam seu blog sempre confiam em sua opinião. Já Camila Coutinho, blogueira de moda, foi responsável pela venda de metade de uma coleção de calçados da Dumond após a publicação de uma foto em seu Instagram. Thássia Naves gerou um número de 200.000 acessos na página de uma loja de roupas infantis em apenas duas horas após um post sobre a marca em seu blog de moda. Em 2016, a youtuber Kéfera Buchmann emplacou seu livro autobiográfico como o mais vendido em não-ficção. Na mesma lista, está o youtuber de games Rezende Evil e Christian Figueiredo.
A jornada dos influenciadores:
- Blogueiros (Bloggers): Em sua gênese, os blogs eram listas de links da internet. Os blogueiros da época, experts em HTML, atuavam como filtros de conteúdo da rede, disponibilizando comentários e o endereço das páginas que visitavam. A prática data de 1997, quando ainda não podíamos contar com a excelência dos buscadores atuais. Desde então, o ato de “arquivar a internet” sofreu alterações com o advento de novas tecnologias. A entrada de plataformas como o Blogger, em 1999, e o Blogspot e Wordpress posteriormente, permitiram que não apenas especialistas em HTML mantivessem um blog. A facilidade em publicar tornou a blogagem mais popular no início dos anos 2000. Os blogs foram apropriados como diários virtuais, warblogs (blogs de guerra), blogs institucionais de empresas, blogs de celebridades, blogs jornalísticos. Mesmo nos diferentes usos, algo em comum entre os blogueiros é a pessoalidade. Desde sua origem como listas, os blogs são inerentemente pessoais, marcados pela voz de seu autor. Os blogs e fóruns, muito antes das redes sociais digitais, foram o espaço ocupado por esses novos atores da cultura da participação. Hoje, a fase que vislumbramos na blogosfera é a dos blogs como mídia. Os blogs são espaços de comunicação, geridos por blogueiros profissionais - “originalmente” da área de Comunicação ou não. Nesses termos de profissionalização, os blogs são a principal fonte de renda de seus autores. Além disso, são encarados como veículos de comunicação, credenciados por leitores, pela blogosfera, pela mídia tradicional e pelo mercado no qual estão inseridos. Não há restrições em relação ao gênero ou tema destes blogs que chamamos de blogs temáticos. Os blogs temáticos são ligados ao entretenimento – passando por assuntos como moda, beleza, viagens, livros, casamento, paternidade, etc. Em comum, os blogueiros desse segmento compartilham a transformação de um hobby em uma profissão. Tem-se que as blogueiras de moda “[...] foram as precursoras de um modelo de negócio que tem se replicado em blogs temáticos dos mais variados: [...], um assunto que o blogueiro se interessa no tempo livre passa a ser um assunto no qual ele é considerado especialista.
- Influenciadores: O termo influenciador digital passou a ser usado mais comumente, no Brasil, a partir de 2015. Um dos principais motivos pode estar atrelado a entrada de novos aplicativos na esfera de produção desses profissionais que deixaram de se restringir a apenas uma plataforma – só o YouTube, no caso dos vlogueiros; ou só o blog, no caso dos blogueiros. Um exemplo: desde 2006, a blogueira Camila Coutinho mantém seu blog Garotas Estúpidas que já foi considerado o sétimo blog de moda mais influente do mundo pela Signature 9. Apenas em 2014, no entanto, a blogueira postou seu primeiro vídeo no YouTube. Desse modo, o termo blogueira parece limitar a sua atuação nas redes sociais digitais. Em 2015, por exemplo, o Snapchat – lançado em 2011 – alcançou números importantes de uso entre os internautas brasileiros o que levou os blogueiros e vlogueiros a participarem também dessa plataforma – a fim de alcançar cada vez mais públicos diferentes e, também, acompanhar seus leitores em múltiplas plataformas. Em entrevista a Bruno Astuto em 24 de julho de 2014 (Revista Época), Camila Coutinho comenta que “[...] o termo blogueira já ficou defasado nesses 10 anos por causa das novas plataformas sociais. Hoje, se você me perguntar minha profissão, vou dizer 'influenciadora digital”. O blogueiro de moda Kadu Dantas, em 23 de julho de 2015, também comentou que “quem é influencer digital tem que ser multiplataforma. Se eu bombo só no Instagram e ele resolve fechar, eu morri. Chega uma nova rede social, você tem que estar atento e pronto para ela”. Tanto Camila quanto Kadu enfatizam o fato de que com as múltiplas plataformas em que os influenciadores atuam, intitular-se como blogueiro (relativo apenas ao blog), não seria suficiente para nomear a profissão.
Fonte: Issaaf Karhaw.